O círio revela a cultura,
anseio e aspirações do povo abaetetubense.
A festa atualiza o mito de fundação do culto e da
festividade de Nossa Senhora da Conceição, principalmente ao reviver os passos
percorridos durante mais de um século, e define o evento como a mais forte
manifestação da identidade abaetetubense.
(Por Albertino Lobato)
Contar
a História do Círio de Nossa Senhora da Conceição é contar, também a origem do
Município de Abaetetuba.
Não
há dúvida de que o distrito de Beja foi o berço da colonização do Município de
Abaetetuba. Abaeté surgiu quase um século depois. O pequeno aglomerado foi
chamado de Samaúma e, mais tarde, batizado de São Miguel de Beja por FRANCISCO
XAVIER DE MENDONÇA FURTADO, aproximadamente em 1630. o povoado foi criado
pelos índios Motiguar, que eram de origem Marajoara, de natureza migratória,
que em certa época cruzaram a Baia de Marajó para se estabelecer em Conde,
(Vila Motiguár) no Rio Pará. Os primeiro relatos sobre Beja foram feitos pelos
Padres Capuchos do Una, em 1635, após percorrerem os rios da Amazônia.
O Aglomerado de Abaeté já existia,
sim, como uma pequena tribo. Seu encarregado era o Padre Alemão ALUÍSIO
CONRADO PFEIL que catequizou os índios Abaetés. Em 1653, os padres capuchos
foram substituídos pelos jesuítas. O Padre Pfeil uniu os aglomerados e
solicitou aos seus superiores a elevação do povoado à categoria de freguesia,
no que foi atendido. A história tradicional de Abaetetuba conta que em 08 de
dezembro de 1724, viajando de Belém do Pará à sua sesmaria, FRANCISCO
AZEVEDO MONTEIRO foi acossado por violenta tempestade, que o desviou da rota estabelecida. O dia consagrado a
Nossa Senhora da Conceição, levou o sesmeiro a pedir sua proteção para si e
para os seus, em troca do que, ergueria no porto seguro em que viesse aportar,
uma capela à santa. Assim, FRANCISCO AZEVEDO MONTEIRO cumpriu a
promessa. Construiu uma modesta capela em madeira de lei para Nossa Senhora da
Conceição. A pequena casa de oração foi construída à margem do Rio Maratauíra,
onde fica atualmente o Cruzeiro, na Avenida Pedro Rodrigues. FRANCISCO
AZEVEDO MONTEIRO era português que chegou ao Pará em 1712. Veio como
proprietário de uma sesmaria – área de terra virgem cedido a quem se dispusesse
a cultivá-la e colonizá-la. A sesmaria de FRANCISCO AZEVEDO MONTEIRO
ficava às margens do Rio Jarumã. FRANCISCO AZEVEDO MONTEIRO mandou
esculpir em Portugal uma imagem de Nossa Senhora da Conceição, a imagem que é
atualmente venerada por todos os católicos da cidade. Essa imagem é de cedro
mogno, pesa 18 quilos, com 1,10cm de altura, por 96cm de busto. A imagem
esculpida em cedro é um modelo ainda medieval, pois o protótipo é de uma mulher
de meia idade e não a de uma jovem. Ressalta-se que FRANCISCO AZEVEDO
MONTEIRO adquiriu a área de terra de Abaetetuba junto à Coroa Portuguesa e
doou para os habitantes do lugar. Talvez, por isso, Abaetetuba é um dos menores
municípios do Pará e um dos poucos do Brasil a ser instituído pela fé e
devoção.
Abaeté passou a ser distrito
oficialmente em 1750. Com o passar do tempo, em 1773, o povo do lugar, liderado
por um Marajoara, de nome MANUEL DA SILVA RAPOSO, começou a construir
uma nova capela para Nossa Senhora da Conceição. A antiga igrejinha, a de FRANCISCO
AZEVEDO MONTEIRO, servia mais como capela Mortuária, pois às suas
proximidades ficava o cemitério de Nossa Senhora da Conceição, que surgira logo
após a construção da primeira igreja. A nova capela ficava na Passagem
Conceição (hoje João Pedro Rodrigues com a Getúlio Vargas). A partir de 1773, a vila começou a
receber a visita mais assídua de Padres que, com os constantes encontros com a
comunidade, fundaram, em 1779,
a 1ª Paróquia de Abaeté. Na Festa de Nossa Senhora da
Conceição de 1785 houve uma novidade: a nova capela. A casa de oração era
pequena, mas em concreto e bonita. Sua inauguração ocorreu no dia 12 de julho
de 1785 e contou com a presença do Sexto Bispo do Pará DOM FREI CAETANO
BRANDÃO.
As questões religiosas de Abaeté
dependiam muito das causas políticas. Muitas vezes a história da religiosidade
ficava ofuscada pelas pretensões políticas. Era o caso, por exemplo, da
Cabanagem. Consta que no ano de 1835, houve uma tentativa de invasão no Vilarejo,
que foi heroicamente defendida pelo TENENTE CORONEL FRANCISCO ANTÔNIO COSTA e
parte do povo. Nessa época, já havia Padre em Abaeté. Desde de
1821 fixou residência no lugar o Padre JACOB CORDEIRO DE MIRANDA. Outro
ano de destaque foi o de 1839 quando a Vila de Beja passou a ser incorporada a
freguesia de Abaeté.
Em 1875 a Vila de Nossa Senhora
da Conceição de Abaeté crescera. A comunidade, já organizada, reúne-se
constantemente. Surgem novas travessas, como, a Travessa Nova do então novo
cemitério de Nossa Senhora da Conceição. Em 1877, Abaeté passara a ser anexado
ao território de Belém, obtendo sua autonomia em 1880, quando o então
Presidente da Província do Grão-Pará JOSÉ ARAÚJO DANIN, instituiu
legalmente a Vila de Nossa Senhora da Conceição de Abaeté. Um ano antes, 1879,
Abaeté já contava com o 1º Pároco. Tratava-se do Padre ANTÔNIO JOSÉ BENTES.
A festividade de 1880 teve um fato
novo. Pela primeira vez se pôde contar com o acompanhamento musical. É que no
dia 25 de abril daquele ano, o Maestro ERMÍRIO PAUXIS fundou a Banda
Musical CARLOS GOMES. Em janeiro de 1881, foi instituída a 1ª Câmara de
Abaeté. No ano de 1888, o povo católico do lugar inaugurava a Igreja de São
Miguel de Beja, que teve sua construção iniciada há quase um século antes. Quem
celebrou a 1ª missa da Igreja de São Miguel foi o Padre FRANCISCO PIMENTEL.
Em 15 de agosto de 1895, Abaetetuba era levada à categoria de cidade.
Com o passar do tempo a cidade de
Abaeté continuou desenvolvendo-se. No dia 02 de abril de 1902 foi inaugurado o
1º Grupo Escolar de Abaeté. A Escola funcionou na Passagem Nossa Senhora da
Conceição (Pedro Rodrigues, onde fica hoje Fazenda Estadual). Seu primeiro
diretor foi o professor BERNARDINO PEREIRA DE BARROS, que há um ano
antes havia se formado no Curso Normal do Instituto de Educação do Pará – IEP.
O 1º Círio oficial de Nossa
Senhora da Conceição aconteceu no dia 08 de dezembro de 1912. Já nesse ano a
Santa ficava na Capela do Divino Espírito Santo, a 1ª Igreja construída em Abaetetuba. A Igreja
foi edificada como pagamento de uma promessa feita pelo Senhor DIOGO DE
CARVALHO. A nova igreja ficava na Travessa Nova, que dava acesso ao
Cemitério de Nossa Senhora da Conceição (a Igreja ficava na Pedro Pinheiro
Paes, onde fica hoje o Prédio do Café Abaeté). No Círio de 1912, a diferença se fez
sentir: a procissão foi realizada pela manhã e não à noite, saiu da Igreja do
Divino Espírito Santo, ganhou a Travessa Nova, foi pela Silva Jardim (hoje Luiz
Varela, a 1ª Rua da Cidade), contornou pelo espaço aberto (hoje Praça da
Conceição) e retornou pela Torquato Barros (hoje Barão do Rio Branco). Houve
uma enchente de Embarcações vindas de diversos lugares. Centenas de fiéis
participaram do evento, com fogos, banda de música e o traje a rigor para
saudar a Padroeira no dia consagrado a ela. A partir desse ano, a Santa passou
a ser “guardada” na Igreja do Divino Espírito Santo, no lugar que a partir dos
anos 30 passou a ser chamado de Jardim Presidente Getúlio Vargas, hoje Praça
Francisco Azevedo Monteiro.
No ano de 1932, foi instituído a
primeira Comissão Executiva para a construção de uma nova igreja para a
Padroeira da Cidade. Faziam parte dessa Comissão os senhores: Joaquim Mendes
Contente, Prudente de Araújo, Oscar Solano, entre outros. No centro da cidade
de Abaeté, naquele ano, já existia a Praça Augusto Montenegro. Um espaço aberto
que ligava a Bom Jardim à Rua Torquato Barros (hoje Praça de Conceição). A
área, que na época media 250m², foi doado pelo Governador Augusto Montenegro.
No dia 27 de maio de 1933, foi instalada a Pedra Inaugural do Novo Templo. No dia
11 de agosto daquele ano o Padre INÁCIO MAGALHÃES, pároco da época,
registrou o imóvel na Comarca de Igarapé-Miri, através do Protocolo nº 109,
livro de imóveis nº 1, página 106. Meses depois o Padre JOSÉ MARIA DE MANAUS,
fazia o registro geral da área de 11.531,25m², contando dessa vez com mais “um
pedaço de terra” cedido pelo senhor Joaquim Mendes Contente. A construção da
Catedral de Nossa Senhora da Conceição durou 7 anos, divididos em duas fases
distintas. A primeira de 1933
a 1936 e a segunda de 1936 a 1939. A igreja, que começou
a receber os fiéis desde 1935, foi reinaugurada no dia 28 de novembro de 1939.
Ressalta-se que foi na Missa da Festividade de 1935 que foi entoado pela 1ª vez
o Hino “Mater Puríssima”, versos do poeta Bruno de Menezes e do Maestro
Abaetetubense Oscar Santos. A execução do Hino comoveu a todos os fiéis.
Sob o piso da Igreja de Nossa
Senhora da Conceição, existe enterrada uma garrafa hermeticamente lacrada,
contendo o nome das pessoas que mais trabalharam para a construção do templo.
São estes os nomes: Padre Inácio Magalhães, Bernardino Mendes, Raimundo Viégas,
José Pinheiro Baia, José Ferreira, Joaquim Mendes Contente, Humberto Parente,
Raimundo Pauxis, Oscar Solano, Raimundo Ferreira e Emiliano Pontes.
A partir de 1935, portanto, Nossa
Senhora da Conceição passou a ser venerada na Igreja Matriz, mesmo sem estar
concluída, e a festividade passou a ser realizada a partir de 28 de novembro de
cada ano.
Já no Círio de 1947, Abaetetuba
contava com duas bandas musicais: a Banda Musical Beneficente Carlos Gomes, a
mais antiga da cidade e a Banda Virgem da Conceição, fundada naquele ano, por
Francisco Margalho. Durante as festividades, após a Ladainha, o povo passeava
pelo arraial sempre aos acordes das duas bandas musicais, que tinham os coretos
para a execução de suas partituras. Em 1952, no período de 05 a 11 de agosto desse ano,
foi construído o monumento do Cristo Crucificado.
O Cristo é o primeiro marco do
Congresso Eucarístico, obra dos Padres Franciscanos com apoio da Senhora
Deolinda Carvalho Costa. No ano de 1961, a Paróquia de Abaetetuba passou a ser
administrada pelos Padres Xaverianos. Chegaram à nossa cidade nesse ano os
Padres Mário e, logo depois, o Padre Vicente Mitidieri. No dia 06 de maio de
1962 foi fundada a prelazia do Abaeté do Tocantins e no ano seguinte, no dia 02
de fevereiro de 1963, assumia a prelazia do 1º Bispo de Abaeté, Dom João Gazza.
O evento contou com a presença do Arcebispo de Belém Dom Alberto Galdêncio
Ramos.
O círio, assim, revela a cultura, anseio e
aspirações do povo abaetetubense, constitui um marco essencial do que
culturalmente é importante para o modo de vida regional. Atualizar o mito, lembrar
os passos dessa história de fé é, também, além de ressaltar esses padrões, pôr
em destaque as instâncias de identificação da nossa gente. A festa de nossa
senhora da conceição é a festa de um povo que se orgulha de um compartilhamento
de valores comuns, afetivos, realizados, essencializados na condição da
humildade.
No de 2015,
vivenciamos o 103° Círio de Nossa Senhora da Conceição. O tema central da
festividade é: “Maria nos ensina a servir”. Assim, a
festividade nos permite um raro momento de reflexão. Uma oportunidade singular
para escutar a palavra de Deus e cumpri-la na missão da construção da Igreja
que Cristo quer.
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